domingo, 19 de setembro de 2010

(Alguns de) Todos


O português ensaboa e esfrega o passeio à porta da sua loja de pechisbeque que dá para o largo do Martim Moniz. Uns chineses guardam um amontoado de caixas de cartão a abarrotar sei lá de quê. Outros passam de audi Amuitos ou num mercedes quase nunca visto. Os miúdos jogam à bola nas traseiras do centro comercial sem se preocuparem se acertam em alguém. Os junkies injectam-se ao cimo de uma escadaria que desenrola a partir do largo do intendente. Os drogados queixam-se da porcaria do festival da mouraria que lhes estraga irremediavelmente o quotidiano. Os intervenientes preocupam-se com todos. Os sem abrigo rejubilam bêbados com o movimento e a confusão. Os turistas percorrem e apreciam. Os locais perdem-se em explicações profundíssimas e politizadas. Os associados retiram os lucros de um investimento de longo prazo. Os políticos inauguram. Os polícias pactuam formalmente com os marginais para que a festa corra bem. Os transeuntes deslocam-se como se nada se passasse. Há visitantes que, de olhos (bem) vendados e acompanhados de um guia, se familiarizam com uma realidade que desconhecem de todo. Os indianos que falam entre eles hindu atendem-te num português fluente. A cigana carregada com um enorme saco de mercadoria que partilha connosco o elevador que, de avariado, não sai do mesmo sítio, incompreensivelmente, não perde a cabeça, nem a postura. A dona da actividade é directiva mais do que a conta. Nós fotografamos um pouco. A fanfarra toca.


2 comentários:

Anónimo disse...

Boa reportagem camarada. Porque não mostraram gente, as fotos vossas?
Era perigoso? Ontem demos uma volta pela baixa. Na Barros Queiroz gente encostada às paredes sentada nas soleiras das lojas fechadas e um pequeno problema. A rua do Benformoso e a Monte da fonte salvo erro (junto ao circo)apresentava-se no seu aspecto normal sem policia e pairavam aqueles olhares de quem vigia os forasteiros com alguma complacência. Ressacas na calçada de cinza. Restos de comida. Musica do paquistão e janelas abertas para o eu azul. O povo mais activo do bairro embebedava-se na praça do MM.A festa continuava na casa do Alentejo com bailarico bem picado. As sarjetas das Portas de Sto Antão fediam.

Anónimo disse...

Boa descrição, dum espaço em que não estive.
Uma zona heterógenea, com algum carácter quase marginal, mas que faz parte da realidade da Lisboa.
O texto consegue transportar-me para lá, parece que percorri o sítio.